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A Hora H de Cuba

  • Foto do escritor: NOS - Núcleo Observando do Sul
    NOS - Núcleo Observando do Sul
  • 14 de nov. de 2021
  • 6 min de leitura

Atualizado: 22 de dez. de 2021

Gisálio Cerqueira Filho[1]

In memorian de Gilberto da Costa,

saudade das nossas conversas sobre o amanhã.






Não há dúvidas que Cuba está relativamente atrasada no que concerne a nanotecnologia especialmente na telefonia para todos e todas, que possibilita o uso corrente dos telefones celulares. De maneira distinta, também nós brasileiros suportamos tal atraso e o simples Edital para o 5 G, ocorrido há poucos dias, demonstra isto. Roberto Amaral, ex-ministro da Ciência e Tecnologia do Brasil, nos adverte que a “China acaba de lançar seu computador quântico, o Zuchonhzhi-2. Baseado na tecnologia de fótons de luz, é capaz de atingir a velocidade 100 sextilhões de vezes maior do que os mais rápidos computadores convencionais...”[2]

Ao menos na América Latina, as atenções se dirigem a Cuba como nunca ocorreu nos últimos tempos. Após um jogo de “esconde/esconde” entre o Estado e manifestantes nas ruas da Ilha, onde ambos ensaiaram uma certa demonstração de força, eis que se marcou forte manifestação para 15 de novembro próximo (2021). A TV nacional de Cuba em meio a um estado febril de participação popular, como já era de se esperar, debateu com o médico Dr. Carlo Leonardo Vásquez González[3] que comparou Yunior García a Vaclav Havel, dissidente do regime comunista tcheco que chegou à presidência do seu país. Sim, pois que este Garcia teria realizado estudos sobre “relações internacionais e estratégia política” na universidade americana de Saint Louis (Missouiri, USA bem como em Madri, Espanha), com foco no tema “Papel das Forças Armadas em uma transição” e com a presença do ex-primeiro ministro espanhol Felipe González. Repete-se o que muitos já viram em seus respectivos países latino-americanos, só que agora com mais sofisticação tecnológica, que inclui fake news, disparos de notícias com robot e frenética criação de um clima social propenso a inconformidade e ação imediata. Ora os EUA sempre souberam explorar bem estas conjunturas.

“Marcha Cívica pela Mudança” é o mote à direita e muito bem compreendido à esquerda, mas com a novidade especial de alcançar toda a Ilha e a partir de múltiplas localidades e mesmo cidades do Arquipélago. Esta denominação do movimento acopla a penúria no campo das comunicações avançadas ao nome da Plataforma dissidente e à própria Ilha de Cuba. Veja-se aqui o belo livro de Leonardo Maduro.[4] Pois que, como escritor e romancista que é, discute com os seus leitores como chegou aos seus festejados e premiados livros, sem afastar-se das condições reais da vida em Cuba, ele próprio arraigado na cultura cubana, da qual é também um estudioso.

As mudanças no Governo de Barack Obama acabaram por surtir pouco efeito político concreto nas relações entre Cuba e USA; com Donal Trump nem se fala, e agora com Joe Biden permanece e aprofunda-se a interferência estrangeira, segundo vários estudiosos. Pois é verdade que tudo parece ser testado e, todavia, segue mantido o bloqueio comercial norte-americano. A despeito dos clamores de muitos países, da própria ONU (Organização das Nações Unidas) e de várias autoridades religiosas, entre elas o Papa Francisco.

Atenção não falta ao governo e isto em época de pandemia – a despeito de uma medicina avançada e popular das vacinas cubanas “Soberana” e “Abdala”, esta última contra a variante Delta, terem gerado tanto ruído popular. A pandemia e suas consequências é hoje um dos principais temas de debate nas ruas, nas casas e nas redes sociais —, o que provocou a reação frontal do governo. Na última semana, os principais dirigentes do país e a mídia oficial dedicaram horas ao assunto, desacreditando a marcha e vinculando-a a “planos intervencionistas dos EUA”. Depois que foi convocada uma primeira passeata em várias cidades do país em 20 de novembro, o governo reagiu marcando para o mesmo dia manobras militares nacionais, o que levou os organizadores a anteciparem o protesto para o dia 15. Aceitamos que a chegada da internet no celular em Cuba facilitou uma dimensão nova nos protestos políticos. Mas diz o presidente cubano: não vamos legitimar as ações imperialistas na política interna nem ceder ao desejo de restauração neocolonial. Como reflexo do atual cenário bilateral nas relações com os Estados Unidos, a embaixada desse país em Cuba tem desempenhado um papel ativo nos esforços para subverter a ordem interna de nosso país[5]. Há a possibilidade da manifestação ser proibida pelo governo por considerá-la uma “provocação desestabilizadora”, o que não cancela o confronto latente e certa polarização social cresce a níveis jamais vistos.

Na hora presente, não por acaso, o grupo disposto a manifestações explícitas e políticas contra o governo é coordenado por Yuri Garcia, artista e especialmente dramaturgo, embora tenha sido denunciado pelas forças públicas do Estado como agente internacional. A plataforma Arquipélago criou uma comissão independente de juristas para auxiliar os manifestantes, que diz ter recebido dezenas de denúncias. Uma plataforma digital com o belo nome Arquipélago apresenta-se como movimento de oposição ao Governo e decididamente assume a responsabilidade pela convocação do movimento. Isto não exclui, antes inclui, uma ampla luta ideológica com massivo disparo de fake news. Não se exclui, entretanto, certa movimentação a testar no plano das relações internacionais o papel a ser desempenhado seja pela Rússia, seja pela China visando a verificação da reação externa. Não há dúvidas também da pugna internacional no campo da telefonia, especialmente do 5 G, entre EUA e China no que concerne à disputa comercial na América Latina.

Uma denúncia contundente à política dos Estados Unidos, que insiste em aplicar uma estratégia de guerra não convencional contra Cuba tornou-se manifesta, em uma declaração da Assembleia Nacional do Poder Popular (ANPP), no início, nesta quarta-feira, 27 de outubro, de seu 7º período ordinário de sessões da 9ª Legislatura.

O comunicado “condena as ingerências e as resoluções ofensivas contra Cuba no Parlamento Europeu, promovidas por um pequeno grupo dos seus membros, e agradece aos eurodeputados que levantaram a sua voz naquele palco, denunciando a duplicidade de critérios de quem mente e difama. Expressa sua gratidão ao amplo e diversificado movimento de solidariedade com a Revolução Cubana. O texto, aprovado por todos os deputados, ratifica a determinação de ser fiel às convicções expressas por nosso Comandante-em-chefe, ao proclamar: a Revolução é defender os valores em que se acredita ao preço de qualquer sacrifício; Revolução é modéstia, abnegação, altruísmo, solidariedade e heroísmo; É uma profunda convicção de que não há força no mundo capaz de esmagar a força da verdade e das ideias; é unidade, é independência, é lutar” pelos nossos sonhos de justiça para Cuba e para o mundo, que estão na base do nosso patriotismo, do nosso socialismo e do nosso internacionalismo».[6]

Fato é que Cuba vive e respira. Pretende comemorar o 502º aniversário da fundação da Villa de San Cristóbal de La Habana no próximo 15/11/2021 com um variado programa de atividades festivas, artísticas, com a reabertura de sítios culturais. E diz, decidida, que ninguém vai aguar-lhes a festa...

Referências

[1]Professor titular na e pesquisador sênior da UFF. Atualmente é membro efetivo da Associação Universitária de Psicopatologia Fundamental (AUPPF), São Paulo, fundada pelo Dr. Manoel Tosta Berlinck. Foi presidente do Fórum do Mercosul (FoMerco). Esteve em Cuba em meados dos anos oitenta do século XX. Participou do Primeiro Encontro sobre Marxismo y Psicologia realizado na Facultad de Psicologia de La Habana. Pela primeira vez a Psicanálise apresentava-se em Cuba após a Revolução. Assim, dava sequência ao trabalho apresentado originalmente no VII Congresso Internacional de Psicoterapia de Grupo, na Universidade de Copenhagen, em agosto de 1980, intitulado “Psicoterapia de grupo e ideologia”. O autor, interessado nos estudos de fronteira entre Ciências Sociais (destaque para a Ciência Política & Psicanálise), concluiu em Cuba o livro “Análise Social da Ideologia”, que foi publicado no Brasil pela Editora Pedagógica Universitária (EPU), São Paulo, 1988; Em 1982, publicou sua Tese doutoral na USP (FFLCH) sob o título “A questão social no Brasil: crítica do discurso político”. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1982. [2] Amaral, Roberto. Apud Physical Review Letters, 25/10/2021. [3] “Carlos Leonardo Vázquez González não é só Fernando, o agente dos órgãos de Segurança do Estado, como agora todos sabem. Há pouco tempo revelou os vínculos que, por mais de duas décadas, manteve com elementos contrarrevolucionários, a fim de prevenir a materialização de ações desestabilizadoras e a subversão política no país. É também o especialista de primeiro grau em Medicina Geral e Oncologia, Mestre em Ciências, que desde a sua consulta no Instituto Nacional de Oncologia e Radiobiologia se estabeleceu como um profissional digno e admirável periódico GRAMNA, 07/11/2021.

[4] Maduro, Leonardo. Água por todos os lados, Rio de Janeiro: Ed. Boitempo, 2020. [5] Ver depoimento no periódico Granma, Cuba, 04/11/2021 [6] Facebook / twitter / telegram; 04/1/2021 e várias agências da imprensa internacional.

 
 
 

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